Pictomed – um projeto de Design Inclusivo (entrevista)

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A Pictomed constitui um projeto de Design Inclusivo com o propósito de desenvolver uma linguagem universal que permita o consumo de medicamentos de forma adequada. O projeto surge após a constatação de que as bulas dos medicamentos possuem frequentemente uma linguagem pouco acessível à compreensão do público em geral. Acresce que pessoas invisuais ou com deficiência motora encontram ainda uma panóplia maior de limitações neste mesmo sentido.

O projeto foi criado por duas jovens, de igual modo empreendedoras e criativas portuguesas, nomeadamente Sara Agostinho  e Romina Fernandes. Ambas formadas em Design Gráfico, pela Escola Superior de Artes Aplicadas, em Castelo Branco.

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Quais as motivações que levaram, duas formadas em em Design Gráfico/ Comunicação, se fundirem num projeto ligado à área da saúde? Para além de efetivamente procurarem um mundo mais inclusivo.

O projeto Pictomed surgiu em 2009, quando na cadeira de tipografia, foi proposto a ambas as promotoras um exercício, que consistia em aplicar diferentes tipografias, corpo de texto e cor, numa bula de medicamento e compreender como essas alterações influenciavam a legibilidade do documento. Quando a fundadora Romina Fernandes se deparou como este pequeno exercício afectava a  leiturabilidade da bula, questionou-se como fariam as pessoas com problemas de visão para terem acesso a uma informação com tamanha relevância.

Foi neste contexto que surgiu a ideia de criar uma solução, tentando aliar as nossas competências técnicas a uma necessidade real. O fato de não ser direcionado à nossa área de formação, não é inédito, pois em design de comunicação, é comum deparamo-nos constantemente com trabalhos de temáticas que não dominamos. Contudo tivemos desde inicio a consciência de que a área em que nos estávamos a inserir (saúde) é sensível. Todos os produtos e serviços são criados com normas mais estandardizadas, aplicando regras para o cidadão comum, a nossa motivação passou principalmente por incluir pessoas que não se enquadram normalmente nesses padrões, mas que têm os mesmos direitos à informação. Para além disso também pretendemos conferir maior qualidade de vida, pois as pessoas poderão ser mais autónomas e consequentemente mais ativas.

Estima-se que “cinquenta por cento da população mundial não toma corretamente a medicação”. Dados que não ficam à margem da atenção, de que modo se pode afirmar que a alteração (complemento) à apresentação das bulas e medicação possa contribuir para a diminuição do uso incorreto do medicamento?

Um medicamento é concebido com finalidade curativa, contudo a sua eficácia não depende meramente da sua composição mas também de outros fatores, que se traduzem numa administração correta. Sendo a bula a principal fonte de informação oficial disponibilizada, acreditamos que esta não é acessível a um conjunto de pessoas. O nosso objetivo é complementar a informação atual, para uma toma mais eficaz e rápida.

A nossa solução teve como principio a criação de pictogramas, que representam através de desenhos os conceitos tangíveis do processo de toma dos medicamentos. A linguagem visual é um forte recurso na transmissão de mensagens, facilitando assim a comunicação, pois é mais simples e direta. O nosso cérebro tem tendência para reter melhor a informação visual.

Nesse sentido a Pictomed criou um sistema de pictogramas que caracterizam aspectos como: horário, dosagem, modo de toma e patologias, etc. de modo a personalizar a terapêutica a cada pessoa. Acreditamos que este será um grande contributo para a  diminuição do uso incorreto do medicamento, pois a informação está disponibilizada em cada caixa, num formato de autocolantes, com grande dimensão e contraste. Estes estarão sempre presentes no ato da toma, relembrado assim ao consumidor qual o modo certo de tomar a sua medicação.

De que modo procuram alcançar este mesmo objetivo?

Nos últimos meses a Pictomed esteve a desenvolver o protótipo, para testar e validar em contexto real, de modo a comprovar a eficácia e funcionalidade do sistema. Para nós, como designers, é importante compreender as reais necessidades dos utilizadores, para desenvolver um produto que seja totalmente inclusivo. O nosso objetivo é que o nosso produto chegue ao público pretendido, para isso neste momento estamos à procura de recursos financeiros, por exemplo investimento e parcerias, para o desenvolvimento do produto e angariar os recursos necessários. Em paralelo a equipa da Pictomed está a preparar uma campanha de Crowdfunding, prevista para breve.

Quais as grandes vitórias alcançadas até à data? É possível verificar que se encontram presentes em Farmácias da Covilhã e Fundão, qual a área geográfica de influência que a Pictomed procura alcançar?

A primeira vitória foi o passaporte para o empreendedorismo, que deu a grande possibilidade de continuar com projeto, pois ambas as promotoras tinham um trabalho fixo e não tinham total disponibilidade para o seu desenvolvimento. Esta bolsa proporcionou a dedicação a tempo inteiro, tendo sempre como foco a Pictomed.

Outras grande vitória alcançada até hoje, foi conseguirmos mover pessoas, que acreditam no projeto e que têm contribuído para a evolução do mesmo. Todas elas com diferentes ambivalências desde: gestão, financeira, consultoria , social media, relações públicas, ciências farmacêuticas e medicina, têm acrescentado valor ao projeto, com os seus feedbacks nas diversas áreas.

E por último a mais importante de todas, tem sido ver o impacto do projeto implementado nas farmácias, as pessoas referem que é uma mais valia e que entendem melhor a terapêutica, temos testemunhos como o da D.Clementina “que giro…existem ideias realmente muito giras, esta é muito prática e necessária” ou como o da farmacêutica Catarina, (na Farmácia de Oeiras, onde foi realizado um beta testing): “O projeto é magnífico, está muito bem desenvolvido e é muito pertinente”. Para nós tem sido impressionante, a receptividade ao projeto e corresponder aos ideais para o qual foi desenvolvido.

Sendo um projeto de design inclusivo, não podemos afirmar que temos uma zona geográfica de atuação especifica, pois pretendemos que a Pictomed esteja em todo o lado. Contudo houve a necessidade de selecionar algumas farmácias para a realização dos beta testing, neste caso selecionamos a zona da capital e no interior do País, por espelharem realidades bastante diferentes e assim obtermos diferentes feedbacks.

A equipa é atualmente constituída por mais dois elementos, contando com o apoio de quatro instituições, de entre elas o Governo Português. Será de prever a longo prazo um aumento nestes setores correto? Quais os grandes objetivos a alcançar daqui em diante?

Como referimos, neste momento a nossa equipa já conta com um conjunto de elementos das mais variadas áreas. A longo prazo pretendemos aumentar a equipa, pois quanto mais diversificada for, mais valências terá o projeto. O nosso objetivo passa também por obter apoio e parcerias de instituições /associações ligadas à área da saúde.

Na próxima fase, a Pictomed pretende desenvolver a Mobile APP, pois será um grande complemento ao sistema, e ajudará sobretudo pessoas invisuais. Esta terá outras funcionalidades importantes, como por exemplo os alarmes.

O grande passo a alcançar será produção e comercialização do produto, fazendo assim chegar o sistema Pictomed junto do seu público alvo e também alcançar outros mercados internacionais. Pretendemos assim, ajudar a criar uma sociedade mais justa e informada, e este será o nosso contributo para um mundo melhor.

Por último, seguindo num outro sentido, gostava de compreender como os mundos de ambas criadoras se encontraram, assim como numa ótica de mensagem, qual o conselho que dariam para pessoas que juntas procuram desenvolver um projeto. (O que é necessário em termos informais, entre outros aspetos)

O nosso caminho cruzou-se durante a Licenciatura, e teve continuidade no Mestrado. Durante o Mestrado ambas as criadoras estavam a desenvolver projetos de Design Inclusivo para o sector da saúde e ambos tinham o mesmo intuito: investigar, desenvolver e simplificar informação para um nicho específico, e perceber como o design poderia ter um contributo tão importante na componente social. Ambas somos apaixonadas por desafios e pela nossa área de formação, sempre quisemos aliar os nossos conhecimentos a algo que fosse realmente útil para a sociedade. Após a conclusão do Mestrado, cada uma seguiu o seu rumo. Até que julho de 2014 surgiu a oportunidade de nos juntarmos e continuar a Pictomed. Mais do que colegas de trabalho somos amigas, apesar do principal fator que nos uniu nesta aventura, foi partilharmos a mesma vontade de contribuir com o nosso trabalho para melhorar a vida das pessoas.

O principal conselho que podemos deixar é fazerem aquilo que realmente gostam e que acreditam. A escolha da equipa é sem dúvida o maior desafio de qualquer projeto, pois mais que competências técnicas, é necessária paixão e empenho a cem por cento, seja qual for o seu papel. Outro conselho que podemos deixar é não ficar fechado em casa, é importante criar rotinas e ter um local específico para trabalhar. No nosso caso, optámos por uma incubadora e tem sido bastante interessante a troca de sinergias com outras startups. Por último, mas também muito importante, não tenham medo de falar sobre o vosso projeto, a partilha de ideias com pessoas das mais diversas áreas, e que provavelmente já passaram por experiências semelhantes, faz-nos “pensar fora da caixa”.

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[Para mais informações acerca da Pictomed pode consultar os seguintes links: www.pictomed.pt; www.facebook.com/Pictomed. Ou ainda entrar em contacto através de pictomed@gmail.com.]

 

fotos: DR

Soraya Gadit ( Inocrowd) em Entrevista

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A Inocrowd corresponde a uma Startup com vista a estabelecer uma relação direta entre o mundo académico ou de alguém que tenha uma solução – Solver – e o mundo empresarial – Seeker. Procurando diminuir o GAP / distanciamento existente entre ambos.
Soraya Gadit é uma das fundadoras da Inocrowd, que surgiu a 20 de janeiro de 2011. Soraya é formada em Ciências Farmacêuticas na FFUL (Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa) e tem um MBA em Finanças e Gestão da AESE acabando, neste projeto, por ser a CEO da InoCrowd. Os outros dois fundadores são Mário Lavado licenciado  em Engenharia Física e Materiais e João Moita licenciado em Tecnologias de Informação.

Uma mulher à frente duma empresa tem de ser 300% (trezentos por cento) melhor que um homem para demonstrar que realmente é eficaz.

De que modo três pessoas de áreas tão dispares acabam por enveredar num negócio deste tamanho em Portugal? Quais os elementos de união entre os fundadores?

Embora sejamos de facto de áreas muito diferentes, encontrámo-nos  num MBA em Finanças e Gestão na  AESE. De grosso modo no decorrer do MBA tivemos de fazer uma cadeira, Naves (Novas Aventuras Empresariais) que culminou no desenvolvimento da Inocrowd.

De onde surgiu a ideia geral de atuação da Inocrowd?

A InoCrowd surge da observação da existência de um “gap” entre as Universidades (Mundo Académico) e o Mundo Empresarial e da constatação de que o WEB 2.0 poderia ligar estes dois mundos. Assim criámos uma plataforma Web 2.0 a  www.inocrowd.com de forma a facilitar esta ligação.

Uma das frases marcantes das suas apresentações da Inocrowd foi, a meu ver, “Queremos por Portugal a inovar melhor”. Neste mesmo sentido poderia falar um pouco mais das forças que vos motivaram a avançar com a Inocrowd, num ano em que os efeitos da crise eram bastante difíceis em Portugal.

Exatamente por estarmos em crise é que a criação da InoCrowd fez tanto sentido. A única forma de sairmos da crise é inovarmos e para isso é necessário criarmos um ecossistema e ambiente favorável a isso, aproximando as universidades, onde está grande parte do conhecimento, a empresas.

Inocrowd em 2011 tinha em vista expansão da mesma para o estrangeiro numa ótica de Crowdsourcing (plataforma tecnológica que permite o trabalhador exercer a sua função em qualquer espaço geográfico). Este objetivo verificou-se possível?

De facto era e é, do nosso interesse, projetar a Inocrowd além-fronteiras, como também já tivemos oportunidade de o fazer. Fizemos, por exemplo, uma parceria com o Chile, no entanto, o que a experiência permitiu constatar é que evidentemente a questão de proximidade cultural é fulcral no que toca à implementação do Crowdsourcing.

Neste mesmo sentido, que países lhe parecem mais favoráveis à realização da extensão desta plataforma?

Neste momento estamos à procura de sócios nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), essencialmente, atendendo que existe uma maior proximidade em termos culturais, sendo também o fator linguístico determinante no sucesso desta relação.

De que modo caracteriza a evolução entre 2011-215 (parceiros; taxa de sucesso; etc.)?

Neste momento temos uma taxa de sucesso de 95% (noventa e cinco por cento), conseguimos arranjar soluções num período entre as quatro e seis semanas. Esta evolução também é acompanhada por um aumento de número de Solvers (pessoas que têm uma solução). Conseguimos alcançar já perto de 350.000.000,00 pessoas em todo o mundo.

Quais as grandes vitórias alcançadas pela Inocrowd no mesmo período?

Sem dúvida que conseguirmos soluções inovadoras, por exemplo, para empresas como a Autoeuropa do Grupo Volkswagen, foi uma das grandes vitórias da InoCrowd. A InoCrowd conseguiu no espaço de seis semanas encontrar uma solução que permite a não destruição de seis carros por ano. Isto vai levar a uma redução de milhares de euros por ano no grupo todo da Volksawagen.

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Para finalizar e seguindo uma linha bastante oposta, resta-me fazer referência à recente data celebrada, o dia da mulher, sendo que se constatou que atualmente existe ainda uma baixíssima representatividade feminina em cargos de decisão/ liderança. Queria questionar-lhe se, na sua vida laboral, já se sentiu prejudicada e/ ou beneficiada por questões de género. Se sim, qual o conselho que dá às mulheres no sentido de como lidar com a situação, numa última questão e mensagem.

Sim, já infelizmente. Vivemos ainda num mundo de homens quando se fala em negócios. Uma mulher à frente duma empresa tem de ser 300% (trezentos por cento) melhor que um homem para demonstrar que realmente é eficaz. Portanto o conselho que dou é trabalhar, trabalhar e trabalhar! Só assim Eles se convencem que o Mundo dos negócios não é só para os homens. Não existe mais nada a fazer e a dizer… Só com trabalho produtivo e eficaz se consegue demonstrar que, nós mulheres, não somos diferentes dos homens, em determinadas coisas até somos melhores.

 

fotos: DR