Spark Agency – Miguel Gonçalves em entrevista

MGoncalvesO Miguel Gonçalves é uma pessoa particularmente difícil de descrever. Não por falta de qualidades já reconhecidas, mas por parecer simplista lançar dois ou três elogios. Talvez desassossegador de mentes entorpecidas encaixe com o papel que tem feito nas inúmeras palestras realizadas ao longo dos últimos anos.

Mas Miguel é muito mais do que isso e a sua visão levou-o mais longe. A Spark Agency é uma empresa criada em conjunto com a Tânia Delalande especialista em talento. Um conceito original e inovador que veio revolucionar o mercado de trabalho. Foi no escritório da Spark que o conheci e tive a oportunidade de o entrevistar. Com amabilidade enorme e uma energia contagiante, conversámos sobre como surgiu a sua ideia, de como é ser empreendedor em português e, principalmente, do mercado de trabalho em Portugal.

Conversámos também sobre o Picth BootCamp, um acelerador de carreiras que já conta com 34 edições e mais de 1000 postos de trabalho. Aliado a uma equipa muito apaixonado, muito viva e focada, redescobrem novas formas de aproximar o talento jovem com as empresas portuguesas.

“ Falem da nossa Excelência. Falem dos nossos casos fantásticos no mundo todo” disse numa palestra do TedEx Youth Braga. Desta vez, foi a Excelência Portugal que falou com ele. E descobrimos que é mais um dos casos fantásticos que é preciso dar a conhecer.

sparkO Miguel e a Tânia são os rostos principais da Spark Agency. Que papel tem cada um na empresa?

O que diz na minha assinatura é comandante executivo e a Tânia é problem solver. O meu trabalho resume-se a imaginar uma parede branca e colocar um ponto preto na parede. “O caminho é este”. O trabalho da Tânia é encontrar a maneira mais cost efective e funcional de chegarmos ao ponto. Garante que a máquina funciona. O meu é mais sugerir, empurrar, fazer crescer ideias.

E foi com a junção destes dois talentos, diversos, que nasce a Spark. Uma empresa dinâmica, explosiva e diferenciadora. Muito jovem mas com a sua posição já muito marcada no panorama nacional.

A Spark tem só tem 3 anos. Em 2011 estávamos já a trabalhar mas era ainda um projeto, não uma empresa. Vamos a meio do quarto ano e a empresa tem vindo a mudar. Temos vindo a explorar novas oportunidades de negócio e por isso o nosso modelo de negócio também tem vindo a evoluir. Hoje temos uma área muito forte de recrutamento, search executive, mas trabalhamos principalmente em employer branding. sparky1aNeste contexto, como se posicionam os Pitch Bootcamp na missão da empresa?

Ajudamos as empresas a serem mais apelativas junto do talento alvo que pretendem magnetizar. Trabalhamos a cultura organizacional ajudando as equipas a desenvolver e ritualizar comportamentos. O Pitch Bootcamp acaba por ser um híbrido de missão com o sonho de mudar Portugal. Acaba por ser o produto que mais problemas viu resolvidos até hoje. Estamos a fazê-lo há dois anos, quase três, já esteve com 3000 mil “miúdos”, 2000 profissionais de 600 empresas, 34 edições. Já chegou a uma fase de apuramento muito sólida. Acaba por ser a coisa mais trabalhada, apurada, que mais investimento viu por parte da Spark.

O conceito do Pitch Bootcamp foi criado de raiz pela Spark Agency. O que traz de novo ao mercado de trabalho?

O que traz de novo? Traz muitas coisas novas, não apenas nos conteúdos mas também na fórmula. A forma per se é bastante disruptiva e o picth bootcamp aparece de uma experiência anterior que tínhamos tido que foi o “So you think you can pitch”. Muito parecido com o “So you think you can dance” ou outros programas do género. Em 2011 lançámos no mercado, correu incrivelmente bem! Estivemos com imensas empresas, 5 mil candidaturas, várias edições, centenas de postos de trabalho e percebemos que existia ali uma oportunidade de negócio muito interessante. O objetivo era redesenhar e reinterpretar a forma como jovens se apresentam nas empresas e como as empresas se apresentam aos jovens, dando origem ao Bootcamp como temos hoje. sparky2aUma das características deste evento é o facto de decorrerem sempre numa universidade. Uma estratégia que pretende aproximar estes dois agentes?

Acontece em faculdades por um ponto de vista simples: muitas empresas têm ainda a perceção que as academias estão muito longes do mercado. E algumas de facto estão enquanto que outras tem já departamentos muito especializados. Quando o Picth Bootcamp acontece neste contexto estamos especificamente a dizer a estes dois stakeholders que precisam de estar juntos! E considerando que em média, cada edição tem 120 empresas, estamos a dizer às empresas que a faculdade esta aberta e estamos a dizer à faculdade que as empresas estão disponíveis para os seus alunos.

Estão também a dizer que ambas funcionam melhor se estiverem juntas.

Funcionam muito melhor se tiverem juntas a vários níveis! Podem ajudar a comunidade académica a direcionar a sua pedagogia. Podem ajudar os alunos a perceber quais as reais necessidades do mercado. E podem ajudar as empresas a perceber quem são estes os jovens, que expectativas têm, que ambicionam, quais os seus objetivos, que canais utilizam até as empresas? Que talento é este que está a crescer todos os dias nas faculdades e que é tão diferente das gerações anteriores? O que lhes vai na alma?

pitch

Os dois dias do Pitch Bootcamp estão amplamente preenchidos do início ao fim. Como estão organizados?

Ao longo dos dois dias os diferentes stakeholders são submetidos a muitas experiências diferentes. Temos um framework que tem vindo a ser desenvolvido e que tem quatro partes fundamenteis. Primeiro trabalhamos com os bootcampers no seu produto. Ou seja, que competências eles trazem ao mercado de trabalho. Perceber quem é que eu sou, o que é que eu já fiz, quais são as minhas principais experiências, que competências já desenvolvi até aqui. Depois passamos para o cliente. Em que tipo de indústrias quero trabalhar? Em que tipo de funções gostava desempenhar? Em que empresas posso desempenhar estas funções?

Mas depois terá de existir a ligação entre os dois, certo?

Claro, e daí passarmos para a proposta de valor. Depois de saber o que é que vendo e a quem vou vender, tenho de perceber que match existem entre as necessidades do cliente e aquilo que lhe apresento. Se houver match tenho uma proposta de valor forte, se não houver é mais fraca. Por fim, trabalhamos a comunicação. Como desenvolver o “eu” online, previsões curriculares, assinaturas de email, como recorrer a candidaturas específicas, candidaturas espontâneas, ….

No 2º dia temos o dia com as empresas e acontece o pitch propriamente dito. As empresas estão distribuídas em mesas com mais três pessoas e cada participante tem agora 3 minutos para fazer um pitch e oportunidade de fazer perguntas e questões.

O Pitch Bootcamp acaba por ser um acelerador da carreira. Em apenas dois dias faz-se um processo que sozinho demorar-se-ia muito mais tempo ou só se fazia muito mais tarde. Acha que é possível aos jovens ficarem referenciados no mercado?

Não, não é possível ficar logo referenciado mas abre muitas portas. Se és universitário ou acabaste o curso à pouco tempo e queres explorar oportunidades de negócio, não conheço nenhum sítio em Portugal mais interessante para o fazer do que o Picth Bootcamp. Porque de uma forma muito rápida, muito cost effective e muito intensa consegues chegar a muitas empresas. Acelera de facto a tua carreira e dá-te uma visão crítica sobre o mercado mas, sobretudo, ajuda-te a pensar no que se quer efetivamente na carreira. Porque se eu quero muito, tenho de estar disponível para investir. É extremamente importante trabalhar muito e bem, mas mais importante trabalhar bem do que muito.  E o bootcamp ajuda-te a perceber isto e mostra que é possível ter uma carreira excecional. Está nas tuas mãos construir essa carreira todos os dias. pitch2A quantidade das empresas presentes no último dia é um dos aspetos mais aliciantes do evento.

E não é apenas a quantidade das empresas mas a qualidade das pessoas que vêm apresentar as empresas! Pessoas muito fortes dessas empresas. Diretores de bancos, diretores executivos, de marketing, de R&D, CEO’s, … Pessoas a quem vendo talento vivo, fresco e forte consigam fazer um bypass ao recrutamento e dizer “Olhem, este miúdo é excecional, coloca em partline e vamos entrevistá-lo”. Ou seja, é a oportunidade de uma pessoa de 20 anos poder falar com pessoas que podem ser potenciais clientes mas que, ao mesmo tempo, podem passar bom feedback sobre as suas opções.

Torna-se possível falar diretamente e de uma forma muito natural com pessoas que muitos não imaginariam conseguir chegar. Acha que é fácil chegar a elas?

Às vezes o mercado tem a perceção que há uma escassez de forma ou de metodologia para entrar em contacto com os agentes de mercado. O que em rigor é mentira. A experiência diz-me que é mais fácil agora entrar em contacto com as empresas do que nunca foi. sparky3aMas esta facilidade advém também de uma mudança por parte das empresas, que têm vindo a alterar nomeadamente o conceito de recrutamento jovem.

A realidade tem mudado dramaticamente. As empresas vão à academia porque precisam de rejuvenescer as suas equipas e de obter ideias novas. Se me perguntares, talvez nos últimos 5 a 10 anos passámos do arquétipo do jovem das fotocópias para o jovem das ideias. São vistos como os talentos novos e que já estão a ser integrados nas empresas. A médio e longo prazo a serão os próximos gestores de primeira linha.

Esta preocupação crescente das empresas pela qualidade dos seus recursos humanos é uma evidência clara. Quer pela criação de programas de captação de alentos quer pelos alargados investimentos que são feitos nesta área. Esta evidência pode levar a um paradoxo, visto que o desemprego jovem tem apresentado resultados assustadores.

Como é que estas duas realidades coexistem?

Ninguém faz grandes investimentos para ter um rapaz das fotocópias. Tens dois mercados atualmente: o mercado das commodities e o mercado dos talentos. No primeiro são os jovens que têm de ir bater à porta das empresas e o grande critério das transações é o preço. No mercado das empresas são estas que vêm ter com os jovens. E isto muda tudo! É outro mercado, com outra configuração. É muito mais pequeno mas também muito mais vivo, onde são os jovens que escolhem onde querem trabalhar. sparky4aÉ muito fácil para os jovens, quando enfrentados com o mercado de trabalho, sentirem que não tem grande proposta de valor para as empresas. O que leva a que isto aconteça?

Uma coisa que acontece com imensa frequência na população universitária é assumirem que ausência de experiência é algo comprometedor. E assumem erradamente que o facto de não terem experiência legitima a utilidade que têm no mercado. Uma coisa que ajudamos no bootcamp é perceber que num recém-diplomado a empresa não espera experiência. Procura preditores de desempenho. O que é que esta pessoa já fez que me permite depreender que será um teamplayer, que fará fit na minha cultura ou numa equipa, que produz resultados…

E que é capaz de lidar com os desafios que vão aparecer. As softs skills ganham cada vez mais importância nas equipas de trabalho e daí serem um ponto importante nos processos de recrutamento. Em que é que o Picth Bootcamp ajuda neste aspecto?

Uma das coisas mágicas que acontece no bootcamp é ajudar a perceber que a moeda de mercado são as competências. E as tuas competências que foram desenvolvidas na academia, nos voluntariados, a fazer desporto, no núcleo de alunos, na Excelência Portugal. As competências que tu desenvolveste em tudo o que já fizeste.

As grandes transformações que ali acontecem ocorrem quando as pessoas se espantam “Uau, eu que achava que não tinha nada para trazer ao mercado, afinal de contas tenho imensas coisas válidas”. É um dos grandes efeitos pedagógicos destes eventos.

No início, muitas pessoas diziam que o conceito não ia resultar. Não foi fácil, mas a Spark mostrou é possível e criaram um produto novo num mercado que precisava de ser abalado. Que conselho dá a todos os portugueses que estão na primeira fase dos seus sonhos, das suas ideias?   

A malta pergunta muitas vezes se aquela ideia é boa ou má, se vai funcionar ou não. E eu respondo da mesma forma: só o mercado é que sabe se presta ou não presta. Só o mercado é que sabe se uma ideia de negócio se transforma num negócio. No início a reação foi lenta, mas o mercado reage sempre, sempre à qualidade e à persistência. Foi estarmos sistematicamente a tentar ser bons e não atirar a toalha ao chão demasiado cedo. Melhorar edição a edição até chegarmos a um ritmo de cruzeiro que cresce por referência.

 

Fotos: DR